pois bem.
sexta feira é dia de contos.
apesar de apenas duas ou três pessoas lerem este blog, espero que estas se divirtam pois.
autor: Chico Araújo

Conto III

Fazia um calor insuportável. Era 24 de Dezembro de 1977, às 21h30, quando João, morador da Rua dos Ourives, no Rio de Janeiro, assistia ao especial de natal da Rede Globo de comunicação; enquanto o pai tardava a chegar. João era bastante atento e insuportavelmente teimoso, tinha seus puritanos 7 anos de idade, feitos semana passada, porém com vigores de outrora; um garoto insopitável deveras. No entanto, estava tranquilo em esta hora. Se não me engano, assistia ao apresentador de nome de xícara, com umas ou outras dançarinas e por que não, de nomes bastante peculiares.

Foi assim. E foi assim esgotando o natal. Ou a sua brevidade. Sei que o calor tirou-lhe a atenção. Abanou um pouco a camisa que a mãe bordara, e folgou um pouco o cadarço que estrangulara os seus pés; antes os pés que o pescoço, pensou, mesmo com sete anos. Era bastante esperto. Sabia inclusive como os adultos faziam bebes, mas fingia não saber. Achava um saco a música popular brasileira, e aquela gente toda esquisita - inclusive os militares, d'estes preferia nem pensar. Mas não entendia muito ao certo a ditadura. Foi quando olhou atentamente ao papai Noel que ficava preso dentro de uma bola de vidro completa de água, com algo que lhe impressionava neve. E pensou que se no Brasil a neve atingisse, o natal seria mais agradável, porque ainda sim sentia aquele impetuoso calor atingir seu sistema.

Assou-se o Peru; chegaram-se as visitas; rezaram uma missa e nada de o pai de João chegar. A mãe parecia furiosa por dentro, mas por fora, fingia delicadeza às visitas.

Ouviu-se um barulho ténue, mas de nada deram importância.

Terminado o Natal, todos foram embora. Passaram-se dias, meses e anos, e nunca o pai de João retornou. A mãe chorou alguns dias, ele também, mas depois passou. O pai de João nunca fora encontrado; sobretudo, a mãe parou de chorar porque ouviu de quintos, que o pai de João fora encontrado em Bahia, com outra rapariga. Ela enfureceu-se e desviou o pensamento. Foi esquecido o pai.
Passados os anos ditos, João cresceu adolescente, e fez 14 anos de idade. Sua mãe empobreceu porque de nada sabia fazer e da Rua dos Ourives, tiveram de se mudar para outro lugar.

É sabido que depois de uma semana de os novos donos terem se apossado da casa,descobriram, na limpeza da chaminé, um corpo pútrido e fétido, chamuscado pela fumaça preta, vestido de papai Noel.

Era o pai de João, que morreu preso na chaminé querendo fazer uma surpresa ao filho e todos lhe fizeram mau juízo.